Algumas notas obrigadas a mote

O <i>NO to LISBON</i><br>do povo irlandês

Sérgio Ribeiro
O que aconteceu a 12 de Junho foi histórico! Sem grandiloquências, sem exageros, sem demagogia. O Não da Irlanda (Estado-membro da UE!) veio agitar o curso da História, por mais que se procure desvalorizar o facto… histórico. Pelo que representa no processo e pelas circunstâncias em que se deu.
- O processo de integração europeia (este!) iniciara-se em 1957, com a assinatura do Tratado de Roma por 6 países, assim tornados Estados-membros de uma associação, enquanto outros ensaiavam a via da cooperação (Convenção de Estocolmo na senda da OCDE) e já havia um processo de integração económica em curso (dos países socialistas).
- Quer a via integração, de «concerto» de economias nacionais – união aduaneira – , quer a via cooperação – zona de comércio livre – foram respostas «de classe» num momento do confronto entre dois sistemas, da luta de classes a nível de Estados-nações.
- Assim se procurava ultrapassar dificuldades derivadas de identidades nacionais mas com regras que respeitavam estas, e que só neste respeito se poderiam alterar.
- Os Estados-membros adoptaram o «passo-a-passo», e o passo do alargamento de 1972 conciliou, de certo modo, as duas vias, entrando a Dinamarca, a Irlanda e o Reino Unido. E, sublinhe-se, não entrou a Noruega porque o seu povo não ratificou – seguindo-se as regras – o que o seu governo negociara e acordara com os outros 9 Estados.
- Depois, alargou-se à Grécia, Espanha e Portugal, formou-se uma incompleta periferia e deu-se o passo de passar ao mercado interno, com um necessário complemento que minorasse o agravamento inevitável das desigualdades e assimetrias, a coesão económica e social, com transferências orçamentais, os fundos comunitários.
- No processo, e nesse passo (antes de 1990!), quatro Estados «mais atrasados» justificaram (porque os representantes de alguns – não os de Portugal! – lutaram por isso) a criação de um Fundo de Coesão: Espanha, Grécia, Irlanda e Portugal.
- Sempre subalternizada, por vezes ignorada, por fim abandonada, o dito objectivo de coesão levou a duas posições extremas: o bom comportamento de Portugal a “lanterna vermelha” nos indicadores económicos e sociais, o bom aproveitamento da Irlanda ao 2.º lugar («medalha de prata») nesses indicadores, logo após o Luxemburgo.
- (Entre parênteses acrescente-se que, no alargamento de 12 para 15, de novo o povo norueguês disse não ao que o seu governo negociara e acordara, e é o País nº 1 no indicador de desenvolvimento humano das NU).
- «Globalizado» o capitalismo, com «mãos livres» de constrangimentos, deu-se na UE a tentativa do passo da constitucionalização, consumando a eufemística «economia de mercado», a federalização, o militarismo. Mas como dá-lo havendo (ainda!) Estados e soberanias nacionais, e regras escoradas nesse facto (ainda) não totalmente substituídas?
- Depois dos referendos francês e holandês que, cumprindo modos nacionais de ratificar o acordado entre executivos, disseram não à «constituição», e das manobras para que não se repetisse o risco, o risco repetiu-se porque não houve forma de evitar que a ratificação na Irlanda fosse por via referendária e não parlamentar.
- E o NO to LISBON dos irlandeses tem o significado histórico de ser a expressão de uma resistência espúria e, por isso mesmo, mais merecedora de valorização porque os bastardos não são os que puderam votar, resistindo, mas os que impediram outros de o puderem fazer para evitar o risco do voto não ser o desejado, instrumentalizado, manipulado.
- Como seria de esperar, a reacção foi imediata e brutal, sobrepondo-se à surpresa. Começando logo pelas esfarrapadas e inconsistentes argumentações do costume, como a de que 4 milhões não podem impedir o avanço de não sei quantas centenas de milhões.
- Este argumento é absolutamente falacioso porque os tais escassos milhões representavam um País, uma identidade, uma soberania, um Estado-membro, cumpriram regras em vigor e, a exemplo do anterior processo de ratificação, muitos mais milhões seriam os que, representando os seus Países, se juntariam aos que, pela Irlanda, puderam dizer NÃO!
- Apareceu logo a manobra batoteira de procurar uma «solução» para o que não tem outra solução que não seja a de aceitar que o tal passo não pode ser dado porque, respeitando as regras, um Estado não ratificou o acordado.
- Agride ouvir e ler a ignóbil chantagem sobre o governo irlandês (que, coitado!, fez o que lhe foi possível… e mais do que devia), chegando-se à baixeza de usar o que foi, nos critérios do sistema, um «bom aproveitamento» dos fundos estruturais, assimilando-o a esmola concedida
- Mais nos agridem as despudoradas afirmações do Presidente da República e do 1º Ministros de Portugal, inexcedíveis no servil «bom comportamento», um dirigindo-se aos irlandeses como se fossem leprosos por terem feito o que fizeram, outro frustrando a esperança que criou ao afirmar que a sua carreira perigaria se acontecesse o que aconteceu.


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